Maruim: uma história que ainda não morreu

Vista panorâmica de Maruim (Foto: Keizer Santos)

*Por Ermerson Porto

Este ano a cidade de Maruim, chega aos seus 159 anos de emancipação política. Ao falarmos em emancipação, trabalhamos com os conceitos de independência e liberdade. Há várias formas de compreensão epistemológica do termo em evidência. Politicamente, e neste sentido, várias povoações da Província de Sergipe Del Rei, desligaram-se de suas Vilas de origem no final do século XIX. Nesse contexto, temos a cidade de Maruim, emancipada da Vila de Santo Amaro e posteriormente elevada a categoria de cidade, em 05 de maio de 1854 pela lei provincial nº 374.
Maruim tem sua gênese na Mombaça, onde se localizava o “Porto das Redes”, a “antiga Alfândega de Sergipe”, no encontro do rio Sergipe com o Ganhamoroba. Mais tarde os moradores deixaram a localidade devido à grande quantidade de mosquitos transmissores de doenças. A povoação de Maruim passou a ser as margens do rio Ganhamoroba, nas proximidades da Igreja São Vicente, onde também estava localizado o antigo Engenho Maruim de Baixo, cujo proprietário era o Sr. Manoel Rodrigues de Figueiredo. O local era bem mais confortável e permitia melhores condições para a expansão do comércio e da agricultura.
Em meados de 1835 com a independência política, e anos depois com a elevação à categoria de cidade, Maruim adquire grande importância econômica, proveniente de sua potencialidade açucareira. O significativo legado histórico à sociedade sergipana, deixado por Maruim, vai do Império à República Brasileira.
Com um solo produtivo e promissor ao cultivo da cana-de-açúcar (uma das maiores riquezas de Maruim na metade do século XIX) a cidade chegou a possuir grandes engenhos. Os portugueses predominavam, mas logo chegaram alemães, italianos, ingleses e suíços. Entretanto é o coronel Gonçalo Rollemberg do Prado, quem se destaca econômica e politicamente, detendo os maiores engenhos e governando a cidade por muito tempo.
No final do século, a força econômica de Maruim era tanta que empresas e indústrias instaladas no município, possuíam filiais em outros Estados e países da Europa. Países como Alemanha, Inglaterra e França mantinham comércio regular com firmas localizadas em Maruim; temos por exemplo: a Casa Inglesa, Schramm e Cia, A. Fonseca, A Casa Cruz, Maynart e Irmãos e Soares & Prado.
Salientamos a empresa alemã “Schramm e Cia”, que tinha filiais em capitais como Recife, Salvador e Rio de Janeiro. O proprietário era Ernst Schramm, onde em ocasião do falecimento de sua esposa, Adolphine, passou a responsabilidade para o sobrinho, Otto Schramm. Este último chegou a ser nomeado cônsul.
A influência desta família fez com que um consulado alemão fosse instalado em Maruim com cerca de trinta alemães, onde fundaram uma colônia. Além dele, em 1850 a cidade ainda contava com consulados da Inglaterra, Noruega e Suécia. Todos eles influenciaram na vida econômica, política, social e cultural daquele município.
A necessidade constante em difundir a ideia de civilização, marcada pela instrução de um povo nas artes e na ciência, foi o pensamento que norteou a criação de instituições como o Gabinete Leitura, permitindo a circulação de novas ideias e valores, e a difusão de obras literárias e artísticas, trazendo prosperidade moral e material para a sociedade; assim a civilização seria capaz de esclarecer o espírito, e conceder o bem estar.
O Gabinete de Leitura de Maruim teve como mentor o cônsul Otto Schramm. As cartas de sua tia Adolphine revelam que em 1860, já possuía em sua residência um rico acervo, que possivelmente, todo ou parcialmente, fora transferido para a biblioteca do Gabinete. Estamos tratando de um espaço de sociabilidade, com um vasto capital cultural, não só para Maruim, mas de referência em Sergipe; tanto enquanto Província do Império, como em Estado da Federação, haja vista a importância deste espaço em ocasião dos acalorados debates liberais republicanos.
No aspecto religioso, os maruinenses sempre foram fervorosos na fé. Um povo de muitas crenças e formas mais variadas de buscar o transcendente. Temos registros da presença da religião de matriz africana, como alguns terreiros de candomblé e casa de umbanda, fruto da forte e marcante presença do negro no município. A cidade conta também com um Centro Espírita, denominado Maria Amélia Alves.
Mas é o cristianismo que sobressai como principal elemento religioso. O maior símbolo da fé católica em Maruim é a Igreja Matriz Senhor dos Passos, localizada na principal praça da cidade. A construção foi iniciada em 1848 e concluída em 1862, apresentando um estilo clássico barroco. A igreja possui uma única nave com dois altares laterais, dois púlpitos em madeira trabalhada e capela do Sagrado Coração de Jesus. Lá estão os restos mortais de pessoas ilustres como o Barão de Maruim “João Gomes de Melo”; Pe. José Joaquim de Vasconcellos; Cel. José de Faro Rollemberg e o Governador Pedro Nogueira.
Além da Igreja Matriz, há várias capelas distribuídas nos bairros e povoados da cidade. A Igreja Matriz de Maruim tem um valor que excede o sagrado, é um patrimônio material, que reflete a historiografia maruinense e é um bem tombado pelo Governo do Estado de Sergipe, pelo decreto 4.988 de 23 de abril de 1981. O monumento deve ser motivo de orgulho para toda a população.
Em se tratando de cristianismo, os protestantes desde o inicio e meados do século XX estão presentes na cidade. Destacamos duas igrejas de forte representação no cenário nacional e são referências no protestantismo. Referimo-nos em primeira instância à Igreja Batista que foi organizada em 1926 com 24 membros, fruto do honroso trabalho evangelístico da Primeira Igreja Batista de Aracaju.
 Depois à Igreja Evangélica Assembleia de Deus, que iniciou seus trabalhos em 1950, com uma mulher negra, irmã Florência (como era carinhosamente conhecida), sob a direção da Convenção Estadual, e levou a mensagem pentecostal à cidade; tendo a igreja seu primeiro templo próprio situado à Rua Quintiliano da Fonseca.
As manifestações populares sempre tiveram grande significância para o povo de Maruim. Começando pela procissão de Senhor dos Passos, que era comemorada no primeiro dia do ano (hoje por decisão paroquial, 21 de janeiro); a festa de Santos Reis no bairro São José e Bom Jesus dos Navegantes no bairro Lachez; o carnaval sempre agitou os maruinenses, sobretudo na década de 1940 e 1950 com os blocos Chic e Santa Cruz nos Micaremes e os penitentes na sexta-feira da Paixão.
O São João era um verdadeiro ritual a céu aberto: um mastro (qualquer tipo de árvore) era posto na direção da janela e a fogueira à frente da porta de casa; o milho assado na brasa ou cozido, e a canjica não podiam faltar; a quadrilha e o Batalhão das Flores era uma grande festa, não tinha quem ficasse parado ao ver as belas moças dançarem pelas ruas de Maruim, guiadas pela porta estandarte e pelo pirrô (um típico mestre-sala).
O sete de setembro sempre movimentou a cidade, desde a preparação do fardamento, até o dia cívico. As costureiras tinham que se desdobrarem para atender à demanda. Depois de tudo pronto, com a abertura feita pela Filarmônica de Maruim, era muita alegria e vibração, sobretudo, quando as bandas Marciais “Coronel Sabino Ribeiro, Dr. Alcides Pereira e Ginásio Cenicista Maruinense (hoje Colégio Felipe Tiago Gomes)”, invadiam a avenida. A festa de Cruz de Bela que acontece sempre em novembro, é outra manifestação que marca o folclore do município.
Os cinco primeiros dias do mês de maio, todos os anos, é um período de grande satisfação para os maruinenses, que festejam neste período o aniversário da cidade. Maruim é uma história que está viva no coração do seu povo, nas águas do Rio Ganhamoroba, na magnífica Igreja Matriz, em cada procissão de Senhor dos Passos, na festa de Cruz de Bela, no Parque Otto Schramm, na carne do sol com farinha de mandioca, depois da feira livre aos sábados, ou mesmo na festa do mastro.
Poucas laudas não dão conta do que desejo expressar por Maruim. Mas é suficiente para declarar que Maruim não morreu. O que tem desfalecido é o amor, o sentimento de pertencimento e salvaguarda, por parte de muitos que se dizem maruinenes, amam ou admiram esta cidade, e nada fazem em prol da manutenção das riquezas materiais e imateriais deste povo.
Em 5 de maio de 2013, Maruim chega aos 159 anos de emancipação política. Esperamos que a sociedade e as autoridades competentes caminhem juntos, norteados pelo desejo de uma cidade melhor e mais eficiente na preservação de suas raízes, rumo ao avanço sociocultural e econômico deste povo.

REFERÊNCIAS

AZEVEDO, Denio Santos. Crise do Império e o Discurso liberal-republicano: a construção do capital social no Gabinete de Leitura de Maruim (1877-1889). São Cristóvão: Universidade Federal de Sergipe/NPPCS. Disponível em . Acesso em 29/04/2013.
AGUIAR, Joel. Traços da História de Maroim. 2. ed. Edição comemorativa dos 150 anos de Maruim. Aracaju: Secretaria de Estado da Cultura de Sergipe, 2004.
CRUZ E SILVA, Maria Lúcia Marques. Inventário Cultural de Maruim. Edição comemorativa aos 140 anos de Emancipação Política da cidade. Aracaju: Secretaria Especial de Cultura, 1994.
FREITAS, José Edgar da Mota [trad.]. Cartas de Maruim. São Cristóvão: Universidade Federal de Sergipe/NUCA, 1991.

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* Graduando em História/ UFS. Bolsista do PIBID História (CAPES/MEC/UFS). Membro do Grupo de Pesquisa: Cultura, Memória e política contemporânea (UFS-CNPq). Endereço Eletrônico ermerson_16@hotmail.com. Orientadora: Drª. Célia Costa Cardoso – professora do Departamento de História/UFS.

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